Entrevista


É UM DEVER DO BLOG DIVULGAR AS CABEÇAS POÉTICAS DE NOSSA REGIÃO.DESSA VEZ TEMOS RONALD FREITAS POETA PRESTES A LANÇAR SEU “CORPO AFLITO ”
F.C- Sei que seu pai foi um ávido leitor quais suas primeiras lembranças dessa época e de que forma isso o afetou?
Inegavelmente a presença da literatura confunde-se com a minha mais grata recordação... a figura sempre grave de meu pai e um mundo muito maior do que eu, mundo de contendas políticas, conversas de gente grande, pessoas “importantes” que volta e meia frequentavam minha casa, me distanciavam muito do colo paterno. Por volta dos dez anos, e meu pai já afastado da política passamos a ter um contato mais próximo, parte desse convívio devo ao Flamengo e os jogos que acompanhávamos juntos pela tv e pelo rádio ( lembra da rádio globo que só a partir das 18 horas apresentava algum sinal, acredita que hoje em dia ainda seja assim ). Dessa época o jogo de damas, os filmes de Charles Bronson e o gosto pela madrugada. Posso dizer que influência intencional nunca existiu, talvez pelo fato de não ter havido tempo hábil, posto que quando o perdi ainda não tinha completado dezoito anos. Mas posso dizer que a figura de meu pai sempre às volta com a leitura, seus livros, jornais, guardião do português mais castiço em seus memoráveis discursos, como orador virtuoso e professor, deixaram-me profunda impressão. Recordo-me apenas do único livro que me indicou, e ali por volta dos quinze, dezesseis, talvez tentando impressioná-lo, despertar sua atenção, surgiram as primeiras leituras de fôlego, como Dostoiévski , Herman Hess e o célebre Retrato de Dorian Gray de Oscar Wilde, que de certo para você também foi um livro de referência. Ingressávamos ali no mundo dos “intelectuais” ( risos ). Voltando a única indicação, o livro era a “ Guerra do Fim do Mundo de Mário Vargas Llosa, lembro-me perfeitamente quando me disse que depois de Euclides da Cunha foi quem com maior veracidade e grandeza retratou o cenário da Guerra de Canudos... tinha grande paixão por esse livro, como também por um compêndio chamado “Discursos Parlamentares de Carlos Lacerda” ... Jorge Amado também era leitura obrigatória. Com a sua ausência, restou-me toda essa biblioteca, a impressão mais funda e uma lacuna que curiosamente foi preenchida por um sujeito que você também conhece muito bem, alguém chamado Hélio Cerqueira, o nosso Velho Harry, o nosso Karamazov, o nosso héroi-alucinado, Helinho. Mas essa já é uma outra história. ( risos )
F.C- Sempre nos reuníamos nas noitadas regadas a bebidas e delas surgiram boas poesias. Quero que você nos conte algo que o marcou .
Tempo memorável, de tantas descobertas e questionamentos, tempo de grandes incertezas ( que hoje tornaram-se ainda maiores para mim )... devo considerar que traço mais marcante dos primeiros versos tinha a cor escura e alucinada do bom e velho Augusto dos Anjos, esse foi como um soco no estômago, lembro-me de Cruz e Souza e de um trecho riscado a lápis de cera na parede do meu quarto “ flores sangrenta do soturno vício...”, lembro-me dos poemas marcados pela brasa do cigarro, dos sonetos de Eraldo escritos em qualquer canto, da poesia de Marco Doido. Recordo-me da vodca de muitas madrugadas, de uma sociedade que embora nunca tenha existido oficialmente era bastante disciplinada em suas reuniões.
F.C- Vamos pra duas perguntas de praxe : Quais as suas influencias na hora de escrever? E qual a utilidade da poesia no mundo de hoje ?
Posso dizer que Manuel Bandeira foi meu primeiro alumbramento... quando li “Os Sapos” num fascículo chamado literatura comentada. Depois vieram as escolas literárias do ensino médio, e outros nomes passaram a povoar meu universo. Pessoa, Drummond, Augusto dos Anjos, Cruz e Souza, Florbela Espanca, Ferreira Goulart, Vinícius, Quintana... Raniery Caetano, conterrâneo e grande amigo que trouxe a poesia para perto de mim. Posto que os grande vates pertenciam ao Olimpo inacessível, e de repente um sujeito de minha cidade publica um livro chamado “Apologia das Águas”, o que de certa forma foi um convite aos primeiros rabiscos de poesia. Hoje todos estes que citei continuam a fazer parte das minhas leituras obrigatórias... no momento posso incluir Manoel de Barros ( sujeito que entortou minha poesia de azul ). Quando a utilidade desta, posso dizer que para mim tem valor desmedido, escrevo pra fugir da loucura, distrair o tédio, descobrir novas cores, inventar outras. A poesia me livra da solidão e da mediocridade.
F.C- Você acha que o mundo ainda precisa de um poeta?
Quanto a isso não tenho a menor dúvida, e felizmente eles ainda assombram a realidade dominante. O poeta é vidente no seu tempo, enxerga paragens ainda desconhecidas, não hesita em escarafunchar a ferida exposta... é o dedo da criança que denuncia que o rei está nú. Afora seu poder de tornar o mundo ainda maior... dentro e fora de nós mesmos.
F.C- E seu livro como anda seu lançamento? Tem procurado editora?
Sabes o quanto é difícil editar nesse país, no caso da poesia acredito que os caminhos sejam ainda mais estreitos. No momento tenho mantido contato com duas editoras paulistas e aguardando o valor que caiba no meu orçamento, já que de outra forma morreremos anônimos ( risos ).
F.C- Qual o cheiro da suas palavras? Que sentimentos procura passar?
Porra bicho, minha palavra cheira a tanta coisa... cheira a precipício, paixão, sexo, saudade. Minha palavra tem o cheiro dos mais desesperados sentimentos da humanidade.
F.C- Recentemente você participou de uma coletânea com cinquenta poetas de todo país com a poesia ALUMBRAMENTO, e foi premiado com a primeiro lugar num outro concurso que lhe rendeu inclusive uma premiação em dinheiro. Que representa tais menções?
Curiosamente eu nem lembrava desse concurso promovido pela Flipoços-MG na feira do livro de Poços de Caldas... fiquei surpreso quando fui contactado por eles e tive esse poema publicado nessa antologia que teve a participação de cinquenta autores conforme você citou. Independente da seleção entre dois mil autores, o que me encantou verdadeiramente foi a poesia impressa, vê-la assumir a forma de texto impresso na condição de livro. Pela primeira vez me senti verdadeiramente autor, afora o nível da obra como um todo. Esse que me rendeu algum dividendo financeiro foi realizado em São Paulo e em âmbito nacional, posso dizer que pela primeira vez a poesia me trouxe algum dinheiro e acho que poderei comprar alguns livros e cometer algumas extravagâncias ( risos ).
F.C-Qual a sua relação com a internet no tocante a divulgação do seu trabalho.
Cara, praticamente restringe-se a uma comunidade que gerencio numa rede social. Ali posto vez em quando alguns rascunhos e comento outros que recebo. É um ponto de encontro para uma minoria afeita a palavra poética, uma esquina pra poesia.
F.C- Fazendo uma auto-crítica sobre seu trabalho. Você poderia nos dizer em que grau de maturidade ele se encontra?
Não poderia, mas de alguma forma sinto que o amadurecimento é resultado do alargamento de nossas leituras, do contato com outras letras e por conseguinte com o exercício constante da escrita... de resto, palavra puxa palavra.
F.C- Deixe o seu último sorriso.O  seu recado.
Só agradecer o convite do Fantascópio Cariri por poder falar livremente sobre algo que tanto me motiva. Dizer aqueles que escrevem na penumbra que exponham à crítica seus textos, que falem de poesia sem qualquer pudor, que a levem para o centro da praça, para os mais distantes rincões. Que não se apartem da função social da mesma, do seu caráter de denúncia, e que esta possa tornar mais belo o mundo a nossa volta, as pessoas a nossa volta... ou ainda, pra lembrar Quintana “ Quem faz um poema salva um afogado ”... então que nossas braçadas não cessem, ainda que a praia não esteja vista.

2 comentários:

  1. Unknown disse...:

    Muito bom ver nosso amigo prestes a publicar seu livro. Longo caminho que vale a pena ser trilhado. de imediato já dou os parabéns pois conheço um pouco de sua obra e sei do grande valor que tem. Felicidades meu caro Roninho e parabéns ao blog por oferecer essa oportunidade de divulgação.

  1. Unknown disse...:

    O nome do livro foi mudado de intenções de poesia para cadafalso

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