Prisão de ventre



Quando segurei um corpo frio,
Lavado por pedras fecais...
Percebi sua voz clamar por vida!
Em um paralelo entre lugares
Que eu jamais poderia chegar.
Aquele ser, mergulhava no rio
Mais escuro do seu deus;
Depois voltava inteiramente cansado!
Com carvão e urucu nas mãos,
O rosto melado de barro;
Trazendo em prece os restos de comida
De um almoço que ele não comeria.
Como absorver vida?
Se expelir é a insígnia de um condenado?
Ainda havia uma razoável quantidade de sopros
Saindo daquele amontoado de pele pútrida;
Sua face causava uma intensa violência,
Pra que a vida, se tornasse inútil...
Por sua vez, num grande esforço,
Os sopros se tornaram palavras!
Criou-se um envoltório de lamentos,
Conheci a verdadeira náusea...
Um esforço que me fez acreditar
Que o ser humano seria a maior criação;
Então, conheci um método chamado “lavagem”;
Pela primeira vez, enxerguei a amargura
De uma alma, refletida claramente num olhar...
Não sentia nem pulsar o coração!
Anseios, desejos, metas, esperança?
Tudo saía de maneira espalhafatosa pelo reto,
Seu credo era no inferno!
Até o dia que nada sairia mais;
Foram seis incansáveis dias de prisão,
De tudo que ninguém deseja dentro de si.
Ainda posso escutar seus gritos
Ao enfiarem o terrível instrumento
Naquilo que o destruía;
Acabaram gritos, voltaram sopros,
Acabaram sopros, apenas lamentos soavam...
Após os lamentos?
Apenas o barulho das rodas da maca
Que o levava para o fundo das águas negras,
Para o barro sórdido que trazia na face.

POR REGIS MOREIRA

Poema da buceta cabeluda



A buceta da minha amada
tem pêlos barrocos,
lúdicos, profanos.
É faminta
como o polígono-das-secas
e cheia de ritmos
como o recôncavo-baiano.

A buceta da minha amada
é cabeluda
como um tapete persa.
É um buraco-negro
bem no meio do púbis
do Universo.

A buceta da minha amada
é cabeluda,
misteriosa, sonâmbula.
É bela como uma letra grega:
é o alfa-e-ômega dos meus segredos,
é um delta ardente sob os meus dedos
e na minha língua
é lambda.

A buceta da minha amada
é um tesouro
é o Tosão de Ouro
é um tesão.
É cabeluda, e cabe, linda,
em minha mão.

A buceta da minha amada
me aperta dentro, de um tal jeito
que quase me morde;
e só não é mais cabeluda
do que as coisas que ela geme
quando a gente fode.

Por Bráulio Tavares

Espetáculo da inutilidade




Os óculos escuros
são como vendas da alma.
A tela da TV
ilude os que não tem imaginação.
A música que toca no rádio
transborda insensatez sem linearidade.
Os corpos que desfilam na passarela
são amontoados de células mortas
que exprimem de maneira singela
a fraqueza do espírito humano.

Da escuridão fria do meu quarto
ouço lamentos de corpos famintos .
Da escuridão fria da minha vida
reconheço nas entrelinhas
o desespero das almas perdidas
pelas estradas iluminadas da fé,
pelos caminhos esburacados da falta de fé.

Por isso me pergunto
até o último minuto
atônito e moribundo
se poderia ajudá-los,
mas sei que não,
pois nem posso ajudar a mim,
perdido nas estradas mal iluminadas e esburacadas
fazendo simplesmente nada
para mudar o script
desse triste espetáculo,
de muitos atores famintos
enquanto muito poucos
se alimentam
da miséria alheia.

por Elkson

JARDINS DE MÁGOAS

foto:Grupo Teatral Farinha Seca

Tulipas banguelas acenam amputadas

nos jardins de mágoas trava o artista

a sua árdua batalha expressiva em busca da beleza

saúdo a leveza da vida abrigo obscuridades

demências tangidas demências vividas demências desejadas

calor estéreo transpira o corpo nordestino

o sol que incomoda transborda o céu de luminosidade expressiva

melancolia me domina me atravessa noite a dentro

insónias pesadelos e palpitações prenunciam a presença do diabo

que me tenta ao suicídio

todos os homens estão fadados a morrer

e como diria Becket todos temos que nos conformar pois o inferno nos aguarda

além da estrada no além túmulo post mortem ha! ha! ha!!!

nenhuma transcendência me amedronta ou me provoca

tanto quanto a vida tal qual ela é

the dark side of the moon

a noite persiste com os seus demônios alados

feito pernilongos a perturbar-me o sono

a noite desperta o artista sonâmbulo de inquietações

delirium tremens bombardeiam o tédio

venenos de eletricidade açoitam meu corpo hedonista

e eu falava em tulipas

flores decepadas carnívoras e muchas adornam os jardins dos morros narcóticos

a guerra civil banha em vermelho o sol da tarde inútil de domingo

que cheira a tédio e a naftalina

escuto o rap requiém das favelas chapadas de armagedom

ao som de violinos distorcidos e toscos

adormeço no caos silencioso do inferno kafkiano que habita em mim.

POR LEIDIVAN MALDITO
 
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